domingo, 1 de novembro de 2009

Esquisitices de um tempo saudoso

Um dia qualquer, lá nos idos da década de 1960, no Araranguá, encontrei o barbeiro Alor, filho do Maneca, também barbeiro, assassinado cruel e barbaramente numa noite fria e chuvosa.

O Alor cunhava frases esquisitas, tentando explicar situações e criar figuras de retórica para explicar qualquer coisa.

Ao ver uma mulher muito gostosa passar, dizia: "Nossa, é tão gostosa que chega a ter
punilha nos quatro cantos".

Punilha, até hoje tento saber o que seria. E todos o entendiam. Tratava-se de uma força de expressão para cotar a mulher como MUITO gostosa.

Havia uma turma de estudantes do recém fundado (década de 1950) Ginásio Nossa Senhora Mãe dos Homens muito criativa. Ao ter dúvidas sobre algo, indagava: "Estunidu nadu novo"?

Parecia significar: "Que porra é esta?", ou "E daí, meu, o que você quer dizer com isso?", ou "E daí, tudo legal?". Dependendo do momento e do assunto, valia. Uma fórmula universal de diálogo. Um esperanto da malandragem de então.

Nego Dido, conhecido como um malandro mulherengo, vivia cercado de áulicos. Gostavam dele por ser um companheiro fiel, pra toda hora e pra qualquer tipo de atividade, de trabalho pesado a enfrentamento físico. Forte, Nego Dido se reunia com a turma nas esquinas e contava suas estórias. Mentia como todos faziam, contando vantagens.

Tinha ele, por sua vez, seu vocabulário especial. Lembro que falava em "sair de muleta" no final de semana. "Muleta" era mulher.

Outra coisa do Araranguá eram os apelidos: Lulu, Nadico, Pé de Carne, Touceira de Losna, Gancho, Savelha, Bagre, Macaco Chico (era branco), Cagão (!), Velho, Ferrinho, Inchume, Loló, Luso, Nego Dido, Santinho, Camanga, Tura, Bacanaço, Cigana, Ninfa (a meretriz com quem metade dos guris da cidade se iniciou, menos eu; sou da outra metade), Cabide, Branca (era negro), Zé Gaúcho, Agachado (era baixinho, de pernas arqueadas), Quitandinha (dono da melhor boate que conheci).

Se me perguntarem o nome do Quitandinha, digo: Alírio Monteiro. O do Inchume é Nivaldir Fernandes (bom baterista, ainda bem vivo). O resto não me lembro. E, mesmo na época (muitos ainda estão por aí e outros já foram para o andar superior), se tentassem identificá-los pelos nomes verdadeiros, ninguém saberia de quem se tratava.

Essas esquisitices do Araranguá moldavam seu charme. Ninguém cruzava a cidade sem um apelido. Os meus, de infância, que morreram na adolescência e sumiram no tempo, eram "Pindeco", usado por minha mãe, e "Silóco", usado pelo Aimberê, e só por ele. Significam o que? Sei lá eu, meu irmão. Como disse, prevalecia o charme das esquisitices. Saudosas esquisitices de um tempo.

(Foto: eu, na Boa Vistinha do Meleiro, terra natal, aos dois anos)

Um comentário:

dirce maria corrêa de souza disse...

MUITO BACANA ESSAS PALAVRAS ANTIGAS! EU ESTOU ESCREVENDO UM LIVRO E RESGATANDO TUDO Q POSSO DE ANTIGO, PALAVRAS, FRASES OBJETOS,CATAS,POESIAS,VERSOS PIRICÃO, MAS DE MINHA FAMÍLIA,SOUZA, CORÊA,SILVA E .............
ACHEI VC,P Q ESTOU PESQUISANDO O INSETO DA CARNE MUITO SECA E LINGUIÇA MUITO SECA GURDADOS POR MUITO TEMPO CRIAM PUNILHA.