sábado, 4 de julho de 2009

Papai

Em 15 de fevereiro de 1957 (há mais de 52 anos), meu pai solicitou ao então Inspetor Escolar Otávio Munir Bacha o meu currículo escolar, para que eu ingressasse no Curso Preparatório do Ginásio, em Araranguá. Na época, eu tinha 12 anos. Providenciada a remessa da documentação, papai agradeceu num cartão personalizado (cujo original possuo, ainda hoje, guardado com carinho em meus alfarrábios).Agradecer cavalheirescamente os cavalheirismos de que era alvo sempre foi um hábito de papai, o Doutor Telésforo ou Doutor Machado, respeitado advogado do Araranguá e de Criciúma (cidade onde foi advogado da CBCA, Companhia Brasileira Carbonífera de Araranguá).

Caligrafia impecável, papai caprichava sempre ao escrever seus cartões e suas petições judiciais. Seus arrazoados até hoje são famosos na cidade, para quem costuma compulsar os arquivos históricos do Forum local.

Aproveito para escrever aqui sobre um outro hábito de papai, que nada tem a ver com o de agir como um perfeito cavalheiro (faceta que somente o saudoso Attahualpa, meu mano mais velho, falecido em 15 de janeiro deste ano, herdou à plenitude. Não é à toa que as cinzas do Attahualpa estão lá, em Araranguá, no regaço do pai que ele tanto venerava).

Todos os sábados (como me recordo disso!! E que saudade!!). TODOS os sábados, manhã cedo, papai pegava uma mesinha de cabeceira, uma cadeira confortável do seu escritório e se colocava na frente de nossa casa, ao lado do Posto Esso do André Wendhausen, numa das esquinas da Praça Hercílio Luz, tendo do outro lado o vetusto (na época) Hotel Imperial, do Ludovico Borges, seu Vico.

Nessa mesinha, ele dispunha várias notas de cruzeiro (dinheiro de valor, naquele tempo...) e as amontoava cuidadosamente e ficava aguardando os esmoleiros da cidade para ofertar-lhe uma ajuda.

Soa estranho hoje, mas papai tinha esse hábito que durou muitos anos. E havia os esmoleiros habituais da cidade que, madrugada, já faziam fila para pegar o seu dinheirinho.

À frente deles, sempre o Campolino, um esmoleiro alegre, falastrão, risonho, contador de histórias que, após receber seu "ajutório", ficava horas conversando com papai, contando suas lorotas. E papai retribuindo, claro, contando suas lorotas.

Papai falava fluentemente, e entendia, alemão, espanhol e italiano. Um poliglota. Tinha relações com as personalidades mais famosas da cidade e da região e recebia o respeito de boa parte dos figurões estaduais, até porque descendia de Bernardino Machado, primeiro prefeito eleito de Palhoça e ex-deputado estadual. Mesmo assim, suas melhores relações de amizade e seus melhores momentos eram com pessoas como o Campolino.

Impressionante papai, inimitável...

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